Há alguns dias Amanda Bennett, colunista do Washington Post, publicou um texto sobre os inacreditáveis desafios que nos impedem de morrer da forma como gostaríamos. Amanda começa esclarecendo que a maioria das pessoas sabe o que quer: mais de 90% dizem que gostariam de morrer em casa, a maioria não deseja ser submetida a tratamentos agressivos ou heroicos no final da vida, e não querem procedimentos invasivos que tenham chances mínimas de funcionar. Mesmo assim, continua ela, a abordagem exageradamente agressiva no final da vida continua a arruinar a qualidade de vida das pessoas em seus últimos dias, torturando seus familiares, consumindo recursos médicos inúteis e passando por cima dos desejos tanto dos pacientes quanto daqueles que os amam.
No mundo todo, vemos mobilizações no sentido de melhorar o final da vida das pessoas através da escuta ativa de seus desejos e da oferta de suporte especializado (Cuidados Paliativos), que lhes permita morrer da forma que lhes for mais adequada e com o menor sofrimento possível. Pacientes fazem declarações e postam videos na Internet sobre o assunto. Profissionais da saúde atuam disseminando conhecimentos na área e conscientizando as pessoas. Autoridades aprovam legislações favoráveis a esse tipo de abordagem. Todos parecem concordar que isso é o certo a se fazer. Em teoria.
O que vemos no dia-a-dia é uma realidade muito diferente. A grande maioria dos nossos pacientes terminais morre dentro do hospital, por não ter a estrutura necessária para que isso ocorra em casa. Quando um paciente falece em seu domicílio, as dificuldades burocráticas são tantas que a família invariavelmente se questiona se valeu a pena. Na prática, as equipes médicas continuam a agir da forma como sempre fizeram, muitas vezes por simples hábito, mesmo quando têm conhecimento da possibilidade de uma abordagem mais humanizada.
Mesmo quando todas as questões já foram combinadas, os desejos dos pacientes e familiares foram registrados, mesmo assim não é incomum encontrarmos um paciente terminal entubado na UTI, pois “chegou muito mal e nem deu tempo de perguntar direito o que ele tinha”. Tempo? Não seria mais correto compreender que o mais provável foi que a equipe não quis disponibilizar alguns minutos para ouvir a família porque sabia que seria doloroso e difícil? A formação médica continua priorizando muito mais a cura que o cuidado, tornando esse momento uma tortura para a maioria dos profissionais.
Para as famílias também é difícil. Questões culturais e religiosas muitas vezes anulam qualquer pensamento sensato e nos impedem de tomar as atitudes com serenidade. É necessário um trabalho muito completo e amplo no período que antecede a morte para que a família possa chegar a esse momento com tranquilidade. E mesmo assim o momento não é fácil. Mesmo com instruções explícitas dadas pelos pacientes (por exemplo, quando eles redigem um testamento vital), famílias permanecem relutantes em interromper tratamentos, os quais muitas vezes não são somente inúteis: chegam a ser deletérios (alguns inclusive reduzem o tempo de vida dos pacientes!).
O fato é que, embora muito esteja sendo feito, estamos caminhando muito mais devagar do que o desejável. Mesmo assim, é absolutamente essencial que mantenhamos nosso foco e nossa esperança de que conseguiremos ajustar nossos procedimentos no final da vida para uma realidade mais humana e amorosa. A esperança, vocês sabem, é sempre a última que morre.
Leia o texto do Washington Post na íntegra no link abaixo:
9 de novembro de 2015 às 07:51
Ola Dra, sou sua seguidora e admiro muito seus textos.
Gostaria de pedir indicação de especialista em cuidados paliativos no Rio de Janeiro, para pessoa de minha família.
Obrigada, Iane
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9 de novembro de 2015 às 19:20
Obrigada pelas palavras, Iane, fico feliz!! Quanto à indicação, não conheço nenhum serviço, exceto o do INCA, que se dedica exclusivamente a pacientes oncológicos (não sei se é o caso). Mas sugiro que vc dê uma olhada no site da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (www.paliativo.org.br), onde há vários serviços cadastrados, com qualidade! Espero que dê certo!! Um beijo!
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